O sol, distante, brilha no firmamento, mas não me aquece.
O azul gélido do céu arrefece-me a alma. Mesmo sem nuvens ou
sinais de tempestade, sem oscilações ou mudanças, não obstante, assemelha-se a
um deserto à espera de vida.
É um oceano imenso, o vazio que sinto no peito, e sei que só
os teus braços, o teu corpo e os teus lábios o podem preencher. A falta do teu
calor perturba-me.
Jaz um silêncio gigantesco em mim, sou todas as palavras que
ficaram por dizer, todos os sorrisos apagados, todas as ausências distraídas,
todos os suspiros que deambulam perdidos na aridez do degelo.
Na ampulheta que contemplo, os grão de areia deslizam em
câmara lenta, e apercebo-me que não sou mais do que o reflexo das aspirações,
dos desejos, uma miragem que criei dentro de mim, que se vai esfumando
lentamente, como que um derreter arrastado que vai consumindo o viver.
Encontro-me alheia ao presente, sinto-me aqui, mas
represento somente uma sósia transparente da essência que se precipitou em fuga
apressada rumo a um esconderijo para além de qualquer fronteira, cujo maior
receio é ser estilhaçada novamente em mil pedaços….
A realidade, essa, fica muito aquém da fantasia colorida que
vive do outro lado do espelho. Na verdade, as cores debotaram há muito neste
mundo efémero e fútil. Nada mudou, excepto a minha visão. A teia de ilusão, que
inadvertidamente criei, desfez-se em ínfimas partículas que voaram ao sabor da
aragem. As conchas vazias proliferam em redor, continuamente, numa estranha
dança sem propósito.
Por vezes, não devíamos desejar ser mais do que momentos.
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